Quando vem a carreta do Arboleya, há que se colocar contra o vento... — É mesmo. Tu sente o cheiro antes de v...
Quando vem a carreta do Arboleya, há que se colocar contra o vento...
— É mesmo. Tu sente o cheiro antes de ver ele...
Era assim. É verdade que ele não era “muito cuidadoso da sua pessoa”, mas é preciso compreender que nem ele nem a carreta poderiam cheirar bem. Pertencia ao ofício cheirar mal. A carreta estava toldada com sacos de lã velhos, meio queimados de remédios para curar ovelhas. Estava como que encerada pelo sebo. E nela ele colocava tudo o que comprava, que eram os refugos das estâncias. Couros de epidemias, rasgados ou mal curados, garras, cascarrias. Restos de banha que as pessoas iam colocando, peneirada após peneirada, em latas gordurosas, derretimentos rançosos. Ossos. Saquinhos de fel para os curandeiros…
Ele vestia umas bombachas seguradas por um cinto, de um gêmeo de largura, que descia dos rins até o nascimento do ventre, com lambuzadas de sebo e nódoas de toda laia. Calçava alpargatas rasgadas no peito do pé, redondo como uma bolacha.
Algum curioso, observando a carga, perguntava às vezes:
— Mas onde tu coloca isso, Arboleya?
Cuando viene el carro de Arboleya hay que ponerse contra el viento…
—Mismo. Sentís el olor antes de verlo…
Era así. Cierto que él no era «muy cuidadoso de su persona», pero hay que comprender que ni él ni el carro podrían oler bien. Le pertenecía al oficio oler mal. El carro estaba toldado con bolsones de lana viejos, medio quemados de remedios de curar ovejas. La grasa lo había como encerado. Y en él ponía todo lo que compraba, que eran los desechos de las estancias. Cueros de epidemias, tajeados o mal curados, garras, descascarreo. Sobrantes de grasa que las personas iban echando, colada a colada, en latas pringosas, derrites que ranciaban. Huesos. Bolsitas de yel para los curanderos…
Él vestía unas bombachas sujetadas con un cinto, ancho de un jeme, que bajaba desde los riñones hasta el nacimiento del vientre, con lamparones de grasa y manchas de toda laya. Calzaba alpargatas tajeadas en el empeine, redondo como una galleta.
Algún curioso, observando la carga, preguntaba a veces:
—¿Pero dónde colocás eso, Arboleya?
E ele respondia:
— No povoado... O povoado é que nem porco: aproveita tudo...
— Mas pra quê?
— Se eu te disser que os osso vão parar no açúcar e com as garra eles fazem verniz, tu vai rir...
Começavam a conversar e então o curioso aceitava que o negócio do Arboleya podia ser sujo, mas era bom.
* * *
Em uma caixinha ele colocava o que era para vender ou trocar. Ele preferia a troca à compra e venda. As coisas para vender lhe eram proporcionadas pelo Turco Navidad. Eram coisas para mulheres, a maioria. Prendedores, relicários. Pós e cremes para o rosto. Santinhos.
À margem do povoado, ele tinha o rancho e um galpão de latas abertas para guardar a carreta.
Y él respondía:
—En el pueblo… El pueblo es como el chancho: aprovecha todo…
—¿Pero en qué?
—Si te digo que los güesos van a parar al azúcar y de las garras hacen vernís, te reirás…
Entraban a conversar y entonces el curioso aceptaba que el negocio de Arboleya sería sucio, pero era bueno.
* * *
En un cajoncito ponía lo de vender o cambiar. Prefería el trueque a la compraventa. Las cosas de vender se las proporcionaba el Turco Navidad. Eran cosas para mujeres casi todas. Prendedores, guardapelos. Polvos y cremas para la cara. Santitos.
En la orilla del pueblo tenía el rancho y un galpón de latas abiertas para guardar el carro.
No campo, no verão, ele acampava em qualquer lugar. No inverno, nos galpões das estâncias ou no depósito do armazém do Alves, fim da sua viagem.
Até o dia em que ele resolveu mudar de percurso, para não “fazer a limpa” muito seguido nos fornecedores.
Foi quando chegou, pelo caminho velho de Carapé, na casa do Rosas, que tinha armazém e “compra de frutos”. Ali encontrou o rastro do Méndez. Deu com ele e isso lhe trouxe grandes mudanças na sua vida.
* * *
Ele e o Méndez eram mais do que amigos. Se consideravam irmãos. Um dia, semeados pela vida, longe um do outro, se perderam. Agora, depois de vinte anos, se encontraram.
Os dois eram filhos de peona. Juntos tinham crescido, enquanto as mães ralavam nas cozinhas das estâncias ou lavavam no arroio. Um dia, a mãe do Arboleya foi embora com um contrabandista e não se soube mais deles. Ele ficou com a mãe do Méndez, até que a pobrezinha foi levada para o campo-santo. O Méndez foi parar com um ferreiro basco, muito gente boa.
En el campo, en verano, acampaba en cualquier lado. En invierno, en los galpones de las estancias o en el depósito del almacén de Alves, término de su viaje.
Hasta el día que resolvió cambiar de recorrido, para no «limpiar» muy seguido a sus proveedores.
Fue cuando llegó por el camino viejo de Carapé a lo de Rosas, que tenía almacén y «compra de frutos». Allí encontró el rastro de Méndez. Dio con él y esto le trajo cambios grandes en su vida.
* * *
Con Méndez eran más que amigos. Se consideraban hermanos. Un día, sembrados por la vida, lejos uno del otro, se perdieron. Ahora, después de veinte años, se encontraron.
Hijos de peona los dos. Juntos habían crecido, mientras las madres lomeaban en las cocinas de las estancias o lavaban en el arroyo. Un día la madre de Arboleya se fue con un contrabandista y no se supo más de ellos. Él quedó con la madre de Méndez, hasta que a la pobre la llevaron al camposanto. Méndez fue a dar con un herrero vasco, más bueno que el pan.
Foi aprendiz, cozinheiro e “até assistente”, porque o basco, uma vez por mês, ía ao bolicho e, até não ficar bêbado completo, de cair no chão, ele não parava de beber. Então o Méndez, com ajuda do bolicheiro, o carregava na carreta de pértigo e tocava para a ferraria.
O Arboleya ficou sozinho na estância. E como “não era responsável por ninguém e ninguém por ele”, partiu para o povoado. Fez de tudo. Até que achou o negócio que tinha agora.
O Méndez mudou de pago e daí não se encontraram mais. Até agora.
* * *
O Méndez tinha casado. Era dono de uma ferraria, de uma chacrinha e pai de um guri. Estava firme na vida.
* * *
Após o encontro, começou uma nova vida para o Arboleya.
De aprendiz, de cocinero y «hasta de asistente», porque el vasco, una vez al mes, iba al boliche y hasta que no estaba borracho neto, de caerse al suelo, no dejaba de tomar. Entonces Méndez, ayudado por el bolichero, lo cargaba en el carrito de pértigo y tocaba para la herrería.
Arboleya quedó solo en la estancia. Y como «no era responsable de nadie y nadie de él», se fue al pueblo. Hizo de todo. Hasta dar con el negocio que tenía ahora.
Méndez cambió de pago y ya no se encontraron más. Hasta ahora.
* * *
Méndez se había casado. Era dueño de una herrería, una chacrita y padre de un niño. Estaba afirmado en la vida.
* * *
Después del encuentro, empezó una nueva vida para Arboleya.
Ele chegava no armazém, deixava a carreta, se colocava nas mãos do barbeiro, pegava uma muda de roupa novinha e vestia um terno de alfaiate, que ele depositava ali, quando voltava. No inverno, tomava banho em um velho banheiro para ovelhas; no verão, partia para o arroio. Trocava de roupa e voltava que era “um vendedor ou um violinista de tão bem-vestido”. Então ia para a casa do Méndez. Ficava ali cinco ou seis dias.
A felicidade do Méndez, a amizade ardente que lhe demonstrava, aqueles ermão com que preenchia sua conversa o comoviam. A mulher tinha lhe despertado uma ternura que nunca conhecera e “o machinho”, quando ele chegava, o seguia por todos os lados como um cachorro.
— Se tem eu, ele não precisa nem do pai nem da mãe — dizia o Arboleya, feliz.
Llegaba al almacén, dejaba el carro, se ponía en manos del barbero, levantaba una muda nueva y vestía un traje de sastrería, que depositaba allí, cuando regresaba. En invierno se bañaba en un viejo baño de ovejas; en verano partía hacia el arroyo. Se cambiaba y regresaba que era «un tendero o un violinista de bien vestido». Entonces se iba a lo de Méndez. Pasaba allí cinco o seis días.
La felicidad de Méndez, la amistad caliente que le demostraba, aquellos hermano con que llenaba su conversación le conmovían. La mujer le había despertado una ternura que nunca conociera y «el machito», cuando él llegaba, le seguía por todos lados como un perro.
—Estando yo, no tiene padre ni madre —decía Arboleya, feliz.
Passeava com ele a cavalo, o sentava no colo e lhe contava causos de animais, inventava aventuras e viagens por lugares estranhos para o distrair. Às vezes, o levava para o armazém e o vestia dos pés à cabeça. Uma vez comprou para ele um traje de marinheiro. Foi quando teve que lhe explicar o que era o mar.
— Expliquei pra ele… Mesmo que eu nunca tinha visto… Me obriguei, né!…
* * *
Se lhe perguntavam por que não casava, ele respondia:
— Pra quê?
— Pra ter casa, família.
— Quer mior família do que a do Méndez?
— Tá bom, mas…
— Essa é a minha família! Ela é muito boa. Ele é um homi especial e do guri nem te falo… Eu caso e, vai saber, ela me sai uma quebra-freio e como filho me vem um abobado… Pra mim essa gente é tudo…
* * *
Lo paseaba a caballo, lo sentaba en la falda y le contaba cuentos de animales, inventaba aventuras y viajes por lugares extraños para entretenerlo. A veces le llevaba al almacén y lo vestía de pies a cabeza. Una vez le compró un traje de marinero. Fue cuando le tuvo que explicar lo que era el mar.
—Se lo expliqué… Y eso que nunca lo había visto… ¡Tava obligao!…
* * *
Si le preguntaban por qué no se casaba, respondía:
—¿Pa qué?
—Pa tener casa, familia.
—¿Quiere mejor familia que la de Méndez?
—Bueno, pero…
—¡Esa es mi familia! Ella es buenísima. Él es un hombre especial y el niño no le digo nada… Me caso y a lo mejor me sale una quiebrafrenos y de hijo un pasmao… Pa mí esa gente es todo…
* * *
Estava no final da viagem quando soube que o Méndez morrera fazia alguns dias. Foi uma notícia que o deixou sem fala. Pulou para a carreta e começou a castigar os cavalos que nem louco. Ao anoitecer, chegou na casa.
* * *
Na frente do rancho, viu a mancha negra que a mãe e o filho formavam. As roupas pretas, o silêncio e a imobilidade os fundiam em uma única figura que ia se juntando com a noite.
O Arboleya desceu da carreta, com seu cheiro de gordura rançosa, de creolina, sua barba de vinte dias, as alpargatas desfeitas, os dedos pisando a terra.
Quando já estava perto da mulher e do filho, ficou sem saber o que dizer, agoniado por aquelas presenças que tinham sobre si a morte do amigo.
A mulher levantou lentamente, estendeu a mão morta e começou a chorar suavemente. O guri se grudava nela, o rosto sumido no merinó preto da saia. Depois se virou para a casa.
Estaba al término del viaje, cuando supo que Méndez era muerto hacía días. Fue una noticia que lo dejó sin habla. Saltó al carro y empezó a castigar a los caballos como un loco. Al anochecer llegó a las casas.
* * *
Frente al rancho, vio la mancha negra que formaban la madre y el hijo. La ropa negra, el silencio y la inmovilidad les fundían en una sola figura que iba juntándose con la noche.
Arboleya bajó del carro, con su olor a grasa rancia, a creolina, su barba de veinte días, las alpargatas deshechas, los dedos pisando tierra.
Ya sobre la mujer y el hijo, se quedó sin saber qué decir, abrumado por aquellas presencias que tenían sobre sí la muerte del amigo.
La mujer se levantó lentamente, le estiró la mano muerta y se puso a llorar suavemente. El niño se apretaba contra ella, la cara fundida en el merino negro de la pollera. Luego se dio vuelta hacia la casa.
— Vou pegar o mate — disse.
E já na porta:
— Não le convido pra entrar porque eu tô sozinha…
O Arboleya se aproximou da carreta. Apoiou-se no cabeçalho e começou a chorar. Tinha certeza de que o Méndez, ao partir, tinha levado com ele a mulher e o filho e o tinha deixado sozinho…
Mais sozinho do que antes, quando era sozinho e não sabia…
Tradução: Mayte Gorrostorrazo e María Noel Melgar.
—Voy a buscarle el mate —dijo.
Y ya sobre la puerta:
—No lo hago dentrar porque estoy sola…
Arboleya se acercó al carro. Se apoyó sobre las varas y se puso a llorar. Tenía la seguridad de que Méndez, al irse, se había llevado a la mujer y al hijo y lo había dejado solo…
Más solo que antes, cuando era solo y no lo sabía…