Martiniano raras vezes se aproximava da fogueira da estância, como faziam frequentemente os outros posteiros. E, quando o fa...
Martiniano raras vezes se aproximava da fogueira da estância, como faziam frequentemente os outros posteiros. E, quando o fazia, era para sentar e ficar calado, fumando, a cabeça meio erguida como que fazendo um esforço para se lembrar de alguma coisa. Não parecia ouvir nem ver. Recebia o mate, devolvia, recebia de novo e, de repente, como se alguém o chamasse, saía para o campo, montava e partia.
O cachorro sempre o acompanhava.
Ao falar o cachorro, já se sabia que era o de Martiniano, pois os outros cachorros tinham nome, ou se distinguiam por o cachorro de fulano ou sicrano. O cachorro se parecia com Martiniano em muitas coisas. Nem ao chegar nem ao partir se aproximava dos outros cachorros. Nem os outros dele. Uma coisa que chamava a atenção e fazia pensar. Alguma coisa esquisita tinha naquele cachorro que o afastava dos outros.
Os dois — homem e cachorro — pareciam sempre encerrados dentro deles mesmos. Uma solidão que lhes saía de dentro os afastava de homens e coisas.
Martiniano rara vez se acercaba al fogón de la estancia como lo hacían frecuentemente los otros puesteros. Y cuando lo hacía era para sentarse y quedarse callado, fumando, la cabeza medio levantada como haciendo un esfuerzo para acordarse de algo. No parecía oír ni ver. Recibía el mate, lo devolvía, lo volvía a recibir, y de repente, como si alguien lo llamara, salía al campo, montaba y partía.
Le acompañaba siempre el perro.
Con decir el perro ya se sabía que era el de Martiniano, pues los otros perros tenían nombre, o se distinguían por el perro de tal o cual. El perro se parecía a Martiniano en muchas cosas. Ni al llegar ni al partir se acercaba a los otros perros. Ni los otros a él. Una cosa que llamaba la atención y hacía pensar. Alguna cosa rara había en aquel perro que le alejaba de los demás.
Los dos —hombre y perro— parecían siempre encerrados dentro de ellos mismos. Una soledad que les salía de adentro los alejaba de hombres y cosas.
O único que costumava conversar com Martiniano — o necessário entre peão e patrão — era seu Ramón, o dono da estância.
E para isso seu Ramón ia ao posto, pois Martiniano não considerava obrigação sua ir prestar contas de como iam as coisas no campo sob sua responsabilidade.
* * *
No fundo do posto, estava o pastoreio oficial em cuja frente atravessava o caminho real. Algum carreteiro conhecido que largava ali a boiada conversava com ele. Quer dizer, tomava mate e fazia perguntas a Martiniano.
Foi em um desses encontros que um carreteiro, olhando o cachorro, disse isto:
— Bah, cachorro sim que é um animal que aprende bem!… Esse aí parece feito pro senhor!…
El único que solía conversar con Martiniano —lo necesario entre peón y patrón— era don Ramón, el dueño de la estancia.
Y para eso don Ramón iba al puesto, pues Martiniano no consideraba una obligación suya ir a dar cuenta de cómo iban las cosas en el campo a su cargo.
* * *
Al fondo del puesto estaba el pastoreo oficial a cuyo frente cruzaba el camino real. Algún carrero conocido que largaba allí la boyada conversaba con él. Es decir, tomaba mate y hacía preguntas a Martiniano.
Fue en uno de esos encuentros que un carrero, mirando el perro, dijo esto:
—¡Mire que el perro es animal de buen aprender!… ¡Este parece hecho pa usté!…
Martiniano calou por um segundo e respondeu:
— Bah!… O cachorro não tem fim…
Fez uma outra pausa e acrescentou:
— Ele entende o cidadão, mesmo que não fale…
O outro perguntou:
— Será que é verdade que ele é o único animal que nenhum outro bicho come?
— É. Pode ter certeza que eles não comem… A urubuzada morta de fome voa por cima e não chega perto dele… Eles chega com o cheiro e escapa quando reconhece que é o cachorro.
— Respeito, talvez.
Não. Segundo Martiniano, era um mistério. Não sabia como morria o cachorro? Sozinho!
— Ele procura um cafofo escondido e pronto!
— Olha só!
Martiniano calló un segundo y respondió:
—¡Psss!… El perro es sin fin…
Hizo otra pausa y agregó:
—Al cristiano lo entiende aunque no hable…
El otro preguntó:
—¿Será verdad que es al único animal que no lo come ningún bicho?
—Es. Esté seguro que no lo come… Cuervadas muertas de hambre le vuelan y no se le arriman… Las trae el olor y las corre el reconocer que es el perro.
—Respeto, tal vez.
No. Según Martiniano era un misterio. ¿No sabía cómo moría el perro? ¡Solo!
—¡Busca un echadero escondido y ya está!
—¡Fijesé!
Sim. Era assim. O cachorro e o homem eram os únicos que devolviam à terra o corpo todo.
O cachorro, de tanto ouvir seu nome, estava atento à conversa. E isso deixava o carreteiro assombrado.
* * *
Quando Anselmo Díaz — meio parente de Martiniano —, depois daqueles tempos em que virava a noite com uma mulher do circo, começou a andar meio fraco da cabeça, foi ele que fez o diagnóstico:
— Vai acabar ficando louco… Não reparou que o cachorro avança nele e não quer ficar perto?
Porque, segundo Martiniano, os cachorros sabem quando um homem está prestes a perder a razão ou a vida.
Foi ele que levou o cachorro para Díaz. Poucos dias depois, este o degolou e se dependurou na tesoura do rancho.
— Senti mais pena do bicho que do home —foi o comentário do Martiniano.
Sí. Era así. El perro y el hombre eran los únicos que devolvían a la tierra todo el cuerpo.
El perro, de tanto oírse nombrar, estaba atento a la conversación. Y esto tenía asombrado al carrero.
* * *
Cuando Anselmo Díaz —medio pariente de Martiniano—, después de aquellos tiempos en que hacía noche con una cirquera, empezó a andar medio débil de la cabeza, fue él el que hizo el diagnóstico:
—Va a terminar loco… ¿No ve que el perro se le viene y no quiere estar con él?
Porque, según Martiniano, los perros saben cuándo un hombre está por perder la razón o la vida.
Fue él a llevarle el perro a Díaz. A los pocos días este lo degolló y se colgó del mojinete del rancho.
—Me dio más lástima el bicho que el hombre —fue el comentario de Martiniano.
Divulgou-se o causo, e as pessoas começaram a achar que Martiniano e o seu cachorro tinham “um quê de estranho”.
O certo era que os dois pareciam ter alguma coisa que os afastava dos outros, tanto quanto os unia entre si.
Era simplesmente o silêncio no qual os dois fundiam sua amizade.
Martiniano o olhava às vezes até fazê-lo se levantar. O animal erguia a cabeça e parecia que dos olhos sairia um choro de ternura.
Era um olhar que parecia agradecer por algo muito grande.
* * *
Ele tinha mais dois cachorros: a Paloma e o Pampa. Quando ele chegou, os encontrou ali. Eram para o trabalho e para a casa. Não para companheiros. Acompanhavam-no nas lidas pelo campo, matavam raposas e gambás, traziam dos cerros algum animal meio xucro, trabalhavam, em uma palavra. Mas, quando ele saía para o campo, porque sim, “pra ver a noite” ou “pra pensar bobagens” ou se ia na casa do patrão ou no bolicho, ele ordenava:
— Fiquem aí.
Se divulgó la historia y la gente empezó a pensar que Martiniano y su perro tenían «algún algo raro».
La verdad era que los dos parecían tener algo que los alejaba de los demás, tanto como los unía entre sí.
Era simplemente el silencio donde los dos fundían su amistad.
Martiniano lo miraba a veces hasta hacerlo incorporarse. El animal levantaba la cabeza y parecía que los ojos se le iban a volver llanto de ternura.
Era una mirada que parecía agradecer algo muy grande.
* * *
Tenía dos perros más: la Paloma y el Pampa. Los encontró allí cuando llegó. Eran para el trabajo y la casa. No para compañeros. Le acompañaban en las recorridas del campo, mataban zorros y comadrejas, traían de la cerrillada a algún animal medio alzado, trabajaban, en una palabra. Pero cuando él salía al campo, porque sí, «a ver la noche» o «a pensar bobadas» o se iba a la casa del patrón o a la pulpería, ordenaba:
—Quedensén.
E chamava em seguida:
— Cachorro!
Partiam os dois.
Os que ficavam olhavam para eles até que os perdiam de vista. Então se deitavam, tristes, lentamente, deixando escapar uma mistura de lamento e uivo quase inaudível.
* * *
A Paloma dava cria e Martiniano matava as fêmeas que nasciam. Assim os machos tinham mais pra comer. Além disso, estava convencido que as fêmeas incomodavam.
Davam o exemplo os gatos-do-mato.
— Se mata dez e não vê nem uma fêmea…
Talvez as matassem os pais convencidos da justiça daquela lei.
Aliás, ter fêmeas em casa era para juntar cachorros e fazer entreveros de sangue, de onde saíam os matadores de ovelhas ou ladrões de carne.
Y llamaba enseguida:
—¡Perro!
Partían los dos.
Los que quedaban los miraban hasta que los perdían de vista. Entonces se echaban, tristes, lentamente, dejando escapar una mezcla de lamento y aullido apenas audible.
* * *
La Paloma daba cría y Martiniano le mataba las hembras que nacían. Así tenían más que comer los machos. Además estaba convencido que las hembras estorbaban.
Daban el ejemplo los gatos monteses.
—Usté mata diez y no hay una sola hembra…
Las matarían los padres convencidos de la justicia de aquella ley.
Además tener hembras en la casa era para juntar perros y hacer entreveros de sangre, de donde salían los matadores de ovejas o ladrones de carne.
Os machos sempre tinham quem os recebesse. O campo mata muitos cachorros.
* * *
O ressentimento com Curbelo foi por causa do cachorro. Ele veio pedir emprestada a Paloma. Queria cria dela com seu próprio cachorro.
— Não tira mais do que com “o cachorro” — respondeu Martiniano.
Então Curbelo disse que não queria filhos dele.
— Por quê?
— É meio perigoso… Eu vi ele trotar à noite atravessando campos… Vai saber o que ele anda fazendo!
Martiniano olhou para ele e, pelo seu rosto, passou a sombra de um sorriso.
— Deve tá passeando — disse, e lhe deu as costas.
Entrou no rancho.
Curbelo esperou um pouco. E depois conseguiu ver Martiniano ajoelhado, assoprando o trasfogueiro.
Los machos siempre tenían quien los recibiera. El campo mata muchos perros.
* * *
El resentimiento con Curbelo fue por causa del perro. Él le vino a pedir prestada la Paloma. Quería cría de esta con su propio perro.
—No saca más que con «el perro» —contestó Martiniano.
Entonces Curbelo le dijo que no quería hijos de este.
—¿Por?
—Es medio peligroso… Lo he visto trotar en la noche cruzando campos… ¡Vaya a saber en lo que anda!
Martiniano lo miró y por su rostro pasó la sombra de una sonrisa.
—Paseando andará —dijo, y le dio la espalda.
Entró en el rancho.
Curbelo esperó un poco. Y luego alcanzó a ver a Martiniano hincado, soplando el trafoguero.
Foi embora convencido que tinha acabado a entrevista.
* * *
Uma manhã chegou o patrão.
— Ontem à noite apareceram três cordeiros mortos — disse. E acrescentou: — Talvez seja teu cachorro…
— O cachorro?
— É. O Curbelo acha que viu ele. Tu vai ter que matar “o cachorro”.
Martiniano pensou um pouco e respondeu:
— Por que não mata ele mesmo, se encontrar o cachorro?…
— Se tu não matar…
* * *
Acordou à meia-noite e saiu para o pátio. Chamou os cachorros, e o Pampa e a Paloma responderam. “O cachorro” não estava.
Uma baita geada fazia tremer as estrelas em um altíssimo céu. As árvores pendiam da noite levantadas da terra.
Se fue convencido que había terminado la entrevista.
* * *
Una mañana llegó el patrón.
—Anoche aparecieron tres corderos muertos —dijo. Y agregó—: Tal vez sea tu perro…
—¿El perro?
—Sí. A Curbelo le pareció verlo. Vas a tener que matarlo…
Martiniano pensó un poco y contestó:
—¿Por qué no lo mata él si lo encuentra?…
—Si no lo matás vos…
* * *
Se despertó a media noche y salió al patio. Llamó a los perros y acudieron el Pampa y la Paloma. «El perro» no estaba.
Una helada bárbara hacía temblar las estrellas en un cielo altísimo. Los árboles colgaban de la noche levantados de la tierra.
Ele foi despontando o canhadão e chegou ao lugar onde repousava o rebanho como um rio de espuma parado. Um nevoeiro lento se levantava como uma nuvem pesada. Um preguiçoso ondear, do centro para a borda, foi o que ele observou primeiro. Mais perto ele viu, como sobrenadando na espuma, um ponto preto. Depois chegaram os balidos unidos entre si, lentos e planos. Abaixou-se, tateando a faca, e seguiu caminhando encurvado. O cachorro vinha para ele arrastando um cordeiro.
Foi quando soou um tiro. Martiniano caiu, deu dois ou três tombos e ficou de cara para o céu. As estrelas iam para cima. Cada vez mais para cima. Até que desapareceram.
Tradução: Leticia Lorier e Verónica Machado
Se fue despuntando el cañadón y llegó al lugar donde reposaba la majada como un río de espuma detenido. Un vaho lento se levantaba como una nube pesada. Un perezoso ondear, del centro al borde, fue lo que observó primero. Más cerca vio, como sobrenadando en la espuma, un punto negro. Luego le llegaron los balidos unidos entre sí, lentos y planos. Se agachó tanteando el cuchillo y siguió caminando encorvado. El perro venía hacia él arrastrando un cordero.
Fue cuando sonó un tiro. Martiniano cayó, dio dos o tres tumbos y luego quedó cara al cielo. Las estrellas se iban hacia arriba. Cada vez más arriba. Hasta que desaparecieron.