— Qual será a razão por que as mulheres sonham mais que os homens ou têm, pelo menos, muito melhor mem&o...
— Qual será a razão por que as mulheres sonham mais que os homens ou têm, pelo menos, muito melhor memória para reproduzirem, nitidamente, depois de acordadas, os sonhos que tiveram enquanto adormecidas?
— Não sei.
— Nem eu. Pois se quisesses assistir a uma cena invariável, mas em todo o caso interessante, deverias vir à minha casa de manhã cedo, à hora do café. Enquanto meu sogro e eu percorremos os jornais, na ânsia dos telegramas, todo o pessoal feminino da família relata com detalhes minuciosíssimos as incoerências das suas fantasias noturnas, e é curioso observar a atenção com que se ouvem mutuamente!
— Geralmente, as senhoras são muito delicadas…
— Tanto mais que, como eu, devem estar um tanto desconfiadas de que parte das baboseiras que se confiam sejam inventadas na ocasião…
— Não sejas perverso, e acredita antes que, menos preocupada durante as horas de vigília, a imaginação das mulheres trabalhe mais do que a nossa nas horas de sono. Em minha casa dá-se o mesmo fenômeno.
—¿Cuál será la razón por la cual las mujeres sueñan más que los hombres o tienen, al menos, una mejor memoria para reproducir, nítidamente, después de despertarse, los sueños que tuvieron mientras dormían?
—No sé.
—Yo tampoco. Pues si quisieras presenciar una escena invariable, pero en todo caso interesante, deberías venir a mi casa de mañana temprano, a la hora del desayuno. Mientras mi suegro y yo recorremos los diarios, con la ansiedad de los telegramas, todo el elenco femenino de la familia relata con lujo de detalles las incoherencias de sus fantasías nocturnas, y es curioso observar ¡con qué atención se oyen mutuamente!
—Generalmente, las señoras son muy delicadas…
—Tanto más que, como yo, deben estar algo desconfiadas de que parte de las bobadas que se confían sea inventada en el momento…
—No seas perverso, y piensa antes que, menos preocupada durante las horas de vigilia, la imaginación de las mujeres trabaja más que la nuestra durante las horas de sueño. En mi casa ocurre el mismo fenómeno.
Minha sogra reproduz na família o tipo dos interpretadores de sonhos do antigo Egito, da Fenícia ou da Assíria, entidades, como sabes, que faziam disso a sua profissão e que eram nela constantemente consultadas pelo povo supersticioso.
Não imaginas: minha sogra ouve a narração de um sonho como um sacerdote pode ouvir a confissão de um moribundo: com magno respeito; no fim, dá a sua sentença. “Foste mordido por um cão?”, prepara-te para o sofrimento de uma injúria ou de um prejuízo. “Comeste uvas pretas?”, vais derramar lágrimas sentidas. “Viste desembainhar-se uma espada diante de ti?”, correrás grandes perigos… “Partiste ovos para fazer uma fritada ou um doce?”, prepara os ouvidos e a paciência para intrigas e mexericos. “Teu caminho foi atravessado por uma cobra?”, de ti ou de pessoa de tua família, nascerá um filho, dentro de poucos meses. “Montaste um cavalo preto?”, aí está um mau presságio para negócios de interesse… “Viajaste em mar de rosas?”, serás feliz…
— Mas como estás instruído…
— É que também eu ouço invariavelmente os sonhos da família, à hora do café matinal.
Mi suegra reproduce en la familia la clase de los interpretadores de sueños del antiguo Egipto, de Fenicia o de Asiria, entidades, como tú sabes, que hacían de eso su profesión y que eran constantemente consultadas por el pueblo supersticioso.
No te imaginas: mi suegra oye la narración de un sueño como un sacerdote puede oír la confesión de un moribundo: con magnánimo respeto, al final da su sentencia. «¿Fuiste mordido por un perro?», prepárate para el sufrimiento de una injuria o de un perjuicio. «¿Comiste uvas negras?», derramarás lágrimas sentidas. «¿Viste desenvainar una espada delante de ti?», correrás grandes peligros… «¿Rompiste algunos huevos para freír o para preparar un dulce?», prepara los oídos y la paciencia para intrigas y chismes. «¿Una víbora se atravesó en tu camino?», dentro de pocos meses, nacerá un hijo tuyo o de alguien de tu familia. «¿Montaste un caballo negro?», ese es un mal augurio para negocios de interés… «¿Viajaste en un mar de rosas?», serás feliz…
—Pero cómo estás instruido…
—Sucede que yo también oigo invariablemente los sueños de la familia, a la hora del desayuno.
— Infelizmente, cá em casa a nossa sibila não é a minha sogra, mas a nossa cozinheira, e aflige-me ver minha mulher, tão respeitável e tão sensata, chamar a mulata à sala para lhe perguntar o que significa sonhar com pombos brancos ou fogo no telhado.
— Isso significa…
— Não digas; eu não me interesso absolutamente pelo assunto.
— Pois é um assunto curioso.
— Examinando sob outro aspecto; mas agora não tratamos propriamente de sonhos – mas de mulheres.
— Que é assunto mais interessante ainda…
— Conforme… lembra-te que estamos tratando das da nossa família…
— Ainda assim…
— Dizia eu que muitos dos sonhos que ouço diariamente me parecem fabricados na hora em que os impingem; e nesta minha opinião há menos malícia do que curiosidade. Sabes que tenho plena confiança na veracidade de minha mulher; mas por isso não deixo de estranhar que ela possa reproduzir, duas horas depois de acordada,
—Desafortunadamente, acá en casa, nuestra sibila no es mi suegra, sino nuestra cocinera, y me aflige ver a mi mujer, tan respetable y tan sensata, llamar a la mulata a la sala para preguntarle qué significa soñar con palomas blancas o con fuego sobre el tejado.
—Eso significa…
—No lo digas; el asunto no me interesa en absoluto.
—Pues es un asunto curioso.
—Examinado bajo otro aspecto; pero ahora no estamos tratando propiamente de sueños, y sí de mujeres.
—Que es un asunto aún más interesante…
—De acuerdo… recuerda que estamos tratando de las de nuestra familia…
—Incluso así…
—Decía yo que muchos de los sueños que oigo diariamente me parecen fabricados en el momento que los compelen; y, en mi opinión, hay menos malicia que curiosidad. Sabes que tengo plena confianza en la veracidad de mi mujer; pero por eso no deja de parecerme extraño que ella pueda reproducir, dos horas después de despertarse,
sonhos enormes, bem concatenados, divididos em cenas como as comédias em que não há inverossimilhanças nem atropelos. Pode-se acreditar na existência de um sonho sem inverossimilhança?
— … Pode…
— Hesitaste. Vá lá que se possa, uma vez ou outra. Sempre, não. Quanto à minha cunhada, essa quer positivamente fazer romance à força: como não se casou, descreve os raptos de que foi vítima, em braços de rajás ou de imperadores, de muçulmanos ou cristãos…
— A natureza tem com a imaginação os seus acordos…
— Creio; o que me irrita é não só o modo por que são relatadas as peripécias absurdas desses sonhos sem nexo, como a atenção que os outros lhes prestam. É quase doloroso para mim ver perder-se tempo à toa…
— Não tens para onde fugir?
— Não; naquela hora a sala de jantar é a parte mais fresca da casa e onde tenho as minhas comodidades para a leitura do Jornal. Olha, nos sonhos da minha mãe acredito eu.
sueños enormes, bien concatenados, divididos en escenas como las comedias en las que no hay inverosimilitudes ni atropellos. ¿Se puede creer en la existencia de un sueño sin inverosimilitudes?
—…Se puede…
—Vacilaste. Supongamos que se pueda, una vez u otra. Siempre no. Con respecto a mi cuñada, ella quiere definitivamente inventar un romance a la fuerza: como no se casó, describe los secuestros de los cuales fue víctima, en los brazos de rajás o de emperadores, musulmanes o cristianos…
—La naturaleza tiene sus acuerdos con la imaginación.
—Ya lo creo; lo que me irrita es no solo el modo en que son relatadas las peripecias absurdas de esos sueños sin nexo, sino la atención que los otros les prestan. Es casi doloroso para mí ver cómo se pierde tiempo en vano…
—¿No tienes a dónde escapar?
—No; a esa hora el comedor es la parte más fresca de la casa y donde tengo mis comodidades para la lectura del diario. Mira, en los sueños de mi madre creo yo.
— Porque são da tua mãe. As mães são as únicas mulheres em quem os homens creem incondicionalmente.
— Não é por isso; é porque representam uma preocupação diária que a diverte e a absorve: o galinheiro.
— Na verdade, as velhas sonham muito frequentemente com as galinhas. Eu também tenho o meu sonho habitual: fugir de um touro que me persegue, o diabo de um touro malhado, que parece ter contratado com o supremo empresário das minhas visões sonambulescas todos os sonhos que eu possa ter na vida!
— Mas tu não perdes tempo contando à família esses episódios, com certeza?
— Não; mesmo porque ela já os sabe de cor. A minha pobreza de imaginação nisso é espantosa; tanto que minha mulher muitas vezes me pergunta, sorrindo, ao dar os bons-dias:
— Como se portou o teu touro esta noite? E confesso-te que não é sem uma certa humilhação intelectual que lhe respondo: bem ou mal — conforme. Tu se não sonhas é porque tens bom estômago.
—Porque son de tu madre. Las madres son las únicas mujeres en las que los hombres creen incondicionalmente.
—No es por eso; es porque representan una preocupación diaria que la divierte y la absorbe: el gallinero.
—En realidad, las viejas sueñan muy frecuentemente con gallinas. Yo también tengo mi sueño habitual: escapar de un toro que me persigue, un maldito toro manchado, ¡que parece haber contratado con el supremo empresario de mis visiones sonambulescas todos los sueños que pueda soñar en la vida!
—Pero tú no pierdes tiempo contándole esos episodios a la familia, ¿cierto?
—No; incluso porque ya los sabe de memoria. Mi pobreza de imaginación en eso es espantosa; tanto es así que mi mujer muchas veces me pregunta, sonriendo, al darme los buenos días:
«¿Cómo se portó tu toro esta noche?». Y te confieso que no es sin una cierta humillación intelectual que le respondo: bien o mal —según corresponda—. Si tú no sueñas es porque tienes buen estómago.
Para mim o sonho é uma função material da vida. As mulheres têm mais um órgão do que nós, que lhes aumenta a sensibilidade e lhes faz vibrar todos os nervos, do calcanhar ao cérebro. Dormindo ou acordadas, elas são como as célebres harpas da lenda, suspensas dos salgueiros e continuamente tangidas pelo vento…
Como tu, eu também detesto uma espécie de sonhos, mas só uma: — os literários. Não ignoro, por certo, que num conto ou num romance tudo é ficção; mas, desde que essa ficção, por mais absurda, por mais extravagante, por mais inverossímil, não procure iludir-me com uma impressão de realidade, ela se dissolve a meus olhos na mais aguada das indiferenças. Não me interessa saber o que tal ou tal autor sonhou, mas o que viu, o que sentiu e o que criou com plena consciência de sua razão. Como recurso para explicar disparates, o sonho é um processo estafado pelos escritores de todos os tempos. Eu, autor, preferiria passar por doido a atribuir à inconsciência do sono as concepções originais e fantásticas da minha imaginação. Quanto aos outros, quer sejam pesadelos, quer sejam sonhos de amor, eu gosto deles, porque multiplicam as sensações da minha vida e me fazem conceber ideias que, acordado, eu não teria nunca.
Para mí el sueño es una función material de la vida. Las mujeres tienen un órgano más que nosotros, que les aumenta la sensibilidad y les hace vibrar todos los nervios, desde los talones al cerebro. Durmiendo o despiertas, ellas son como las célebres harpas de la leyenda, suspendidas de los sauces y continuamente tocadas por el viento…
Como tú, yo también detesto una especie de sueños, pero solo una: los literarios. No ignoro, por cierto, que en un cuento o en una novela todo es ficción; pero desde que esa ficción, por más absurda, por más extravagante, por más inverosímil que sea, no procure ilusionarme con una impresión de realidad, se disuelve ante mis ojos en la más aguada de las indiferencias. No me interesa saber lo que tal o cual autor soñó, sino lo que vio, lo que sintió y lo que creó con plena consciencia de su razón. Como recurso para explicar disparates, el sueño es un proceso estafado por los escritores de todos los tiempos. Yo, autor, preferiría pasar por loco antes que atribuir la inconsciencia del sueño a las concepciones originales y fantásticas de mi imaginación. En relación con los otros, sean pesadillas, sean sueños de amor, me gustan, porque multiplican las sensaciones de mi vida y me hacen concebir ideas que, despierto, no tendría nunca.
Em uma das raras noites em que não fui perseguido pelo meu touro, sonhei que era um rato e que ia ser engolido por um elefante. Afirmo-te que as impressões sofridas nesse momento angustioso não têm paralelo em outras quaisquer da minha vida… Fiquei sabendo o que é a ameaça de uma morte inevitável e horrível.
— Ouvindo-te a ti, eu penso no que sonhará uma guarda do Jardim Zoológico!
— Sonhará talvez que beija a boca de uma mulher formosa, o que:
Bien que ce soit en songe,
Ça fait toujours plaisir,
como diz a canção; ou sonhará outra qualquer coisa, e, assim sendo, o seu sono não será como o da morte, se é que no da morte, como refletia Hamlet, não se sonhe por acaso também…
To die, to sleep. To sleep, perchance to dream. Oh! Como eu desejaria crer que a ilusão continuasse.
— Quem sabe…
En una de las raras noches en que no fui perseguido por mi toro, soñé que era un ratón y que iba a ser tragado por un elefante. Te afirmo que las impresiones sufridas en ese momento angustioso no tienen paralelo con otras cualesquiera de mi vida… Supe lo que era la amenaza de una muerte inevitable y horrible.
—Oyéndote a ti, ¡pienso en qué soñará un guardia del Jardín Zoológico!
—Soñará, tal vez, que besa la boca de una mujer hermosa, lo cual:
Bien que ce soit en songe,
Ça fait toujours plaisir
como dice la canción; o soñará cualquier otra cosa, y, así, su sueño no será como el de la muerte, si es que en el de la muerte, como reflexionaba Hamlet, no se sueñe por acaso también…
To die, to sleep. To sleep, perchance to dream. ¡Oh, cómo desearía creer que la ilusión continuara!
—Quién sabe…
— É talvez por acreditar que tudo acaba com a matéria que eu adoro o sonho. Quero sentir a vida até no sofrimento. Por tal motivo te direi que se as mulheres sonham mais do que nós, como afirmaste, têm nisso ao menos a compensação da sua infelicidade.
— Que infelicidade?
— Ora essa!… Uma pergunta: — Tu gostarias de ser mulher?
— Eu?!
— Sim, tu.
— Deus me livrasse!
— Aí tens.
—Tal vez por creer que todo acaba con la materia es que adoro los sueños. Quiero sentir la vida hasta en el sufrimiento. Por tal motivo, te diré que si las mujeres sueñan más que nosotros, como afirmaste, tienen en eso al menos la compensación de su infelicidad.
—¿Qué infelicidad?
—¡Y cuál va a ser!… Una pregunta: ¿te gustaría ser mujer?
—¡¿A mí?!
—Sí, a ti.
—¡Dios me libre!
—Ahí tienes.
Traducido por Sthefani Techera.