Apresentamos com muita alegria o primeiro número da revista Pontis, dedicado à autora brasileira Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), carioca, cujas obras estão sendo revisitadas pela crítica literária contemporânea brasileira. Com a escolha da obra Eles e Elas (São Paulo, Francisco Alves & Cia, 1910), cumprimos com um dos principais objetivos de Pontis: divulgar textos brasileiros de pouca circulação no Uruguai, além de sua correspondente tradução. O segundo número de Pontis também estará dedicado à literatura feminina, mas desta vez contemporânea, da uruguaia Elaine Mendina.
O primeiro número de Pontis conta com uma apresentação geral do projeto da revista, que foi selecionado na categoria Revistas Especializadas em Cultura do Fundo Concursável para a Cultura, da Direção Nacional de Cultura (MEC), em sua convocatória 2015. O texto, apresentado por Mayte Gorrostorrazo e Leticia Lorier nas Jornadas Acadêmicas da Faculdade de Humanidades e Ciências da Educação da Universidad de la República em 2015, e traduzido ao português por Amanda Duarte Blanco, explicita o formato geral da revista e os procedimentos adotados para a produção das traduções, bem como informa brevemente sobre as diferentes atividades públicas que serão realizadas no Uruguai. Para maiores informações a respeito das atividades públicas, sugerimos acessar o site da revista: www.revistapontis.com
A revista propriamente dita tem sua primeira seção denominada “O fazer do tradutor”. Neste primeiro número, contamos com o texto, escrito pelo professor titular de Literaturas Uruguaia e Latino-Americana da Faculdade de Humanidades e Ciências da Educação, Pablo Rocca, intitulado “Cruzar a fronteira: literatura uruguaia editada no Brasil/literatura brasileira editada no Uruguai (uma mostra: 1945-2008)”. Após discorrer sobre a figura dos tradutores-contrabandistas e sua importância no intercâmbio cultural entre o Brasil e o Uruguai, o professor apresenta uma mostra bibliográfica de obras de escritores brasileiros ou sobre literatura brasileira publicadas no Uruguai e obras de escritores uruguaios ou sobre literatura uruguaia publicadas no Brasil, abrangendo poesias, narrativas, ensaios, críticas e pesquisas. A tradução ao português do texto da seção “O fazer do tradutor” esteve a cargo de Manuela Pequera e Amanda Duarte Blanco.
Na seção referente à apresentação da autora Júlia Lopes de Almeida, Anna Faedrich, pesquisadora residente na Fundação Biblioteca Nacional (Brasil), apresenta um panorama do contexto familiar da escritora, pouco comum na época, como uma das causas para o destaque de Júlia no cenário literário e na imprensa periódica brasileiros desde a última década do século XIX até a sua morte. Nesta seção, Anna Faedrich finaliza seu texto mencionando a necessidade do “resgate da memória feminina, redimensionando a magnitude e qualidade da atuação das mulheres na literatura, na política e no cenário cultural e intelectual de diferentes épocas”. A tradução ao espanhol do texto desta seção esteve a cargo de Leticia Lorier.
Apresentada a autora, passemos ao cerne de Pontis: os contos e as traduções propostas. O livro selecionado, intitulado Eles e Elas, está composto de 37 contos, no formato de monólogos e diálogos, nas vozes de homens e mulheres que desabafam, alternadamente, sobre o sexo oposto. Sadlier, no texto intitulado “Modernidade e feminino em Eles e Elas de Júlia Lopes de Almeida”1, explicita que “suas críticas, no entanto, vêm inseridas num contexto amoroso, e o tom do livro é levemente satírico, como uma comédia de costumes. Os narradores são geralmente bem-humorados e às vezes até engraçados, embora as vozes masculinas sejam em tom um pouco mais satírico ou zombeteiro e [...] existam algumas
profundas ironias por debaixo de uma superfície calma”.
A primeira tradução do livro Eles e Elas ao espanhol da qual se tem notícia é de Amalia Sato2, professora do curso de Letras da Universidad de Buenos Aires. Embora tão próximos o Uruguai e a Argentina, o livro traduzido por Sato não circula no mercado uruguaio e não faz parte do acervo da Biblioteca Nacional do Uruguai nem do sistema de bibliotecas da Universidade da República. Não sendo possível adquirir no Uruguai a mencionada tradução, Pontis entrou em contato com a tradutora, com o objetivo de apresentar a proposta da revista e pedir uma entrevista. Gentilmente, a tradutora aceitou colaborar com o projeto. Amalia Sato justifica a escolha de traduzir a obra em questão pelas hábeis estratégias de Júlia Lopes de Almeida para retratar a “situação de opressão das mulheres de sua época”. Quanto às dificuldades durante a tradução, menciona o problema de encontrar “um vocabulário que desse o matiz de época para traduzir [...] a linguagem de classe acomodada que permitia a crítica aguda [...] com um tom de salão autorizado diante de ouvintes atentos”. Ao finalizar a entrevista, a professora recomenda aos tradutores literários novatos que vejam “cada texto como algo único” e que sejam leitores apaixonados e viajantes curiosos no universo da literatura. A entrevista com a tradutora na íntegra está publicada no site da Revista Pontis.
Notas
1 Publicado em Travessia n. 26, 1993, pp. 233-242 e disponível aqui
2 Ellas y ellos, Buenos Aires, Editorial Leviatán, 2012.
Neste número, previamente à publicação das traduções, contamos com leituras comentadas de Cleci Bevilacqua, Liliam Ramos e Karina Lucena, professoras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil). A digitalização dos contos escolhidos foi realizada por Verónica Machado e Federico Sörensen, viabilizando, assim, a leitura da autora também nos meios digitais. Apresentamos a seguir a seleção de textos de Pontis n.º 1 — que sofreram alterações de atualização ortográfica em português — em ordem alfabética segundo os títulos originais:
● “Ah! Os senhores feministas!”: desabafos nervosos de um homem cuja esposa não chegou para a hora do jantar. Traduzido por Federico Sörensen. ● “Reparaste?”: diálogo entre amigos sobre as inconstâncias femininas. Traduzido por Mayte Gorrostorrazo.
● “Se eu fosse outra...”: monólogo de uma mulher ofendida por seu marido. Traduzido por María Noel Melgar.
● “Se, por um cataclismo...”: monólogo de um homem acerca das pretensas habilidades manuais das mulheres. Traduzido por Carla Rapetti.
● “Sonhar é viver”: diálogo entre amigos sobre a importância dada pelas mulheres aos sonhos e suas interpretações. Traduzido por Sthefani Techera.
No site, todos os textos originais estão dispostos paralelamente a sua tradução, com vistas a facilitar o contraste entre ambos os textos. Contam também com
espaços abertos destinados a observações acerca das traduções propostas, tanto por parte dos tradutores como dos leitores, o que estimulará o intercâmbio e a aprendizagem; bem como arquivos de áudio em espanhol e português com os textos selecionados, que, além de enriquecerem a revista com um novo meio (o sonoro), possibilitam o acesso de pessoas de visão reduzida aos textos originais e a suas correspondentes traduções. Neste número contamos com a leitura do conto “Se, por um cataclismo...” e de sua tradução, realizada por Mariana Lucía Barros, cantora e compositora bilíngue. Para maiores informações sobre a artista, acesse sua página web: marianalucia.com
Esperamos contar com a participação dos leitores, não somente nas discussões sobre as diferentes traduções, como também na divulgação da revista. Temos certeza de que todos nós nos enriqueceremos com esta experiência.
Integrantes de Pontis